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Corredores estrangulados
Algumas das principais vias de ligação entre regiões mais movimentadas de BH são sufocadas pelo estacionamento rotativo. Especialistas e moradores sugerem mudanças
Fábio Fabrini
Juarez Rodrigues/EM

Ele é motivo de disputa, quase todo mundo quer mais e, quando pode, paga para tê-lo. Mas há quem defenda a idéia: em vários casos, seria melhor que desaparecesse. Para especialistas em planejamento de trânsito, o estacionamento em algumas ruas e avenidas de Belo Horizonte mais atrapalha do que ajuda o motorista, especialmente os corredores mais congestionados. A abertura de vagas nas laterais deixa a pista mais estreita, diminui a capacidade de escoamento e estimula a população a usar o carro de passeio, maior vilão dos engarrafamentos. Numa simples manobra, antes de se acomodar, um carro interrompe a fluidez, embaralha cruzamentos e logo se houve o buzinaço na fila que se forma atrás. A BHTrans alega que a redução dos espaços nem sempre é a melhor solução, mas desenvolve projetos para algumas áreas. Em longo prazo, a empresa pretende adotar medida radical: acabar com o estacionamento rotativo.

Os gargalos causados pelo estacionamento são mais críticos nas chamadas vias arteriais, que servem como rotas de ligação entre bairros ou regiões que atraem muito tráfego. São exemplos as avenidas Bias Fortes, Álvares Cabral, Raja Gabáglia, Getúlio Vargas e Brasil e as ruas Timbiras, Gonçalves Dias e Rio Grande do Norte. Nelas, a maior parte dos motoristas está de passagem e não precisa, de fato, parar ali. Mas as vagas chegam a tomar até 30% da largura, o que faz diferença, principalmente no horário de pico. Para o engenheiro Osias Baptista Neto, consultor em transporte e trânsito, a situação é um contra-senso. “Não há como admitir que algumas vias estão absolutamente congestionadas por falta de capacidade e, ao mesmo tempo, reduzir o número de faixas com o estacionamento”, afirma.

A solução mais viável, segundo ele, seria acabar com os estacionamentos e incentivar o motorista a parar o carro em ruas transversais, que não têm a mesma característica. Em algumas regiões, como a Centro-Sul, a equação não é tão simples, pois faltam vagas até nas vias de trânsito local e a retirada afetaria diretamente a acessibilidade ao comércio e outras atividades vitais para a economia. Mas o especialista explica que algumas medidas são capazes de evitar o impacto. Uma delas é aumentar a rotatividade do rotativo, diminuindo o tempo de permanência. Assim, mais gente poderia estacionar ao longo do dia. Perderia quem trabalha e precisa dessas áreas por mais tempo, mas ganharia a maior parte do público, especialmente a clientela do comércio e outros tipos de estabelecimento.

APOIO À IDÉIA
Pesquisa encomendada pela BHTrans, no ano passado, mostra que o morador da capital é simpático à idéia. Técnicos do Instituto Doxa perguntaram a 1.350 pessoas sua opinião sobre cinco soluções para reduzir os congestionamentos, entre elas o rodízio, o pedágio, a restrição do acesso de carros a algumas áreas e a priorização do transporte coletivo, em detrimento do particular. A proibição do estacionamento em vias saturadas teve a maior aprovação: 78% concordam, ao passo que 20% discordam da proposta. Os outros 2% não sabem ou não respondem.

O professor de engenharia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) Ronaldo Gouvêa diz que a BHTrans deve buscar o equilíbrio e privilegiar a fluidez em algumas vias e o estacionamento em outras, com volume de tráfego menor. Segundo ele, é prejudicial a manutenção de vagas em alguns corredores, como Raja Gabáglia, Getúlio Vargas, Timbiras e Gonçalves Dias. Essa última é importante rota de ligação entre a Região Centro-Sul e a Avenida Amazonas. São cinco faixas, mas, na maior parte da extensão, as áreas de rotativo tomam duas. Não bastasse a redução da capacidade, as manobras causam filas sempre. Na altura do número 1.990, o movimento de veículos, em frente a um supermercado, gera retenções praticamente o dia todo, fechando o cruzamento logo abaixo, com a Rua São Paulo.

O problema se repete na Álvares Cabral, entre a Praça da Assembléia e a trincheira da Contorno. Quem vem da Rua Rodrigues Caldas e faz a conversão para entrar na avenida quase sempre é obrigado a esperar outros motoristas se acomodarem no rotativo. Em segundos, a fila cresce e o caos se instala. “A gente vive isso o tempo todo na cidade. Estacionamento é importante, mas há lugares mais adequados”, diz o auxiliar administrativo Robson de Jesus Silva, de 28 anos.

Mesmo nos pontos em que não é permitido deixar o carro, falta fiscalização e os veículos infestam o espaço. No quarteirão seguinte da Álvares Cabral – em frente ao número 1.720 –, é como se a placa que proíbe parar e estacionar não existisse. A avenida tem três faixas, mas o uso irregular da área a reduz para duas, o que dificulta a passagem no curto intervalo em que o sinal fica aberto e sobrecarrega a interseção com a Rua Santos Barreto. “Não adianta proibir, se não há como controlar”, resume Baptista Neto.

O coordenador de Projetos e Implantações da BHTrans, José Carlos Ladeira, explica que a empresa usa vários critérios para distribuir as áreas de estacionamento, a começar pela capacidade das vias. “Os manuais de engenharia de tráfego trabalham com um máximo de 1,4 mil veículos por faixa, a cada hora, mas nós consideramos um limite de 900”, esclarece. Quando o volume extrapola o ideal, procura-se vetar o estacionamento somente nos horários em que isso ocorre, uma regra definida, em 2005, numa portaria. Em vários pontos da cidade, permite-se parar ao longo do dia, exceto nos períodos de pico. “É preciso conciliar os interesses. De um lado, há a fluidez. De outro, o estacionamento é vital para a atividade econômica”, justifica, acrescentando que a proibição total é adotada em último caso, especialmente quando há prejuízo ao transporte coletivo.
22 abr 2008 - Estado de MinasVoltar