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Máfia das carteiras.
Sindicato dos donos de autoescola procurou órgão para informar sobre fraude

Detran já conhecia esquema

Polícia Civil se restringe a dizer que investigações estão em andamento

Rosângela Valadares
Embora as denúncias contra a máfia da venda de carteiras de habilitação em Betim, na região metropolitana de Belo Horizonte, tenham crescido após as reportagens publicadas por O TEMPO, o Departamento Estadual de Trânsito (Detran-MG) já havia sido informado do esquema.
No início do mês, representantes do Sindicato dos Proprietários de Centro de Formação de Condutores de Minas Gerais procuraram os chefes do órgão com pedidos de providência de combate ao esquema fraudulento.
Segundo o presidente da entidade, Rodrigo Fabiano da Silva, a medida foi tomada após o recebimento de uma avalanche de acusações, vindas de toda a Grande Belo Horizonte e de muitos municípios do interior do Estado, contra atuações de proprietários e funcionários de autoescolas em conluio com examinadores para a comercialização ilegal das carteiras de motoristas.
"Fizemos os relatórios com os nomes dos possíveis estabelecimentos envolvidos no esquema e solicitamos as providências. As denúncias são graves e devem ser investigadas com rigor", afirma Silva.
Conforme o sindicalista, as fraudes em Minas se agravaram após a abertura desenfreada dos Centros de Formação de Condutores (CFC) no Estado, a partir de fevereiro de 2008, com a publicação do decreto que trata do credenciamento das autoescolas. "Cheguei a ser ameaçado de morte caso continuasse com as denúncias", relatou.
Silva afirmou ainda que o Detran não tem estrutura física para fiscalizar os 1.745 estabelecimentos em Minas. "Enquanto isso, donos e examinadores deitam e rolam, comercializando as habilitações sem qualquer preocupação de serem repreendidos", diz Silva.
Pelo segundo dia consecutivo, ninguém da direção do Detran falou sobre as denúncias. Novamente, por meio da assessoria imprensa da Polícia Civil, o órgão informou apenas que as investigações estão em andamento.
Mas, enquanto o Detran não se posiciona em relação às denúncias, dezenas de leitores continuam telefonando e encaminhando e-mails para a redação de O TEMPO, denunciando mais ramificações da máfia das carteiras de motoristas nas localidades onde eles vivem. Um das acusações foi encaminhada por moradores do município de Nova União. Segundo testemunhas, a única autoescola da cidade está com dificuldades para manter as portas abertas porque um funcionário da prefeitura, aliado a examinadores de Contagem e Itabira, estaria agenciando as habilitações.
Outra denúncia é de Ribeirão das Neves. Instrutores de autoescolas da cidade e examinadores se encontram em um bar, instalado na área de exame, e utilizam o banheiro para o repasse da propina angariada antes dos exames.




Consequência

Concorrência desleal faz empresas fecharem as portas
Os proprietários de autoescolas de Minas que se recusam a fazer parte da máfia da carteiras de motoristas ou mantêm seus estabelecimentos cumprindo todas as exigências do Conselho Nacional de Trânsito (Contran) estão enfrentando dificuldades para manter as portas abertas.
A dona de um estabelecimento da região Oeste de Belo Horizonte, informou ontem, que os candidatos a motoristas, alunos dos instrutores que se recusam a pagar propina aos examinadores, são punidos com a reprovação.
"Em dezembro eu passei por essa humilhação. Tentei tirar a carteira D, mas meu instrutor, que também era meu funcionário, recusou-se a negociar com o policial da banca. Mesmo eu fazendo um bom exame, fui reprovada", conta a mulher.
Segundo a empresária, se uma autoescola não tem um bom índice de aprovação, acaba não sendo um atrativo para as pessoas que pretendem fazer aulas de direção. "Se meus funcionários se recusam a negociar a pagar propina, nossos alunos são reprovados. Como serei referência se não consegui manter um bom índice de aprovação?", indagou a mulher.
O presidente do Sindicato dos Proprietários de Centro de Formação de Condutores, Rodrigo Fabiano da Silva, informou ter encaminhado para o Detran muitos pedidos de investigações também de irregularidades nos Centros de Formação de Condutores do Estado.
Entre as denúncias está a dispensa das aulas após a confirmação da presença pelo aparelho de biometria (leitura da digital). "Aquela autoescola que dispensa o aluno de assistir as aulas de legislação é muito mais atrativa do que a que obriga a pessoa a ficar em sala de aula", opina Silva. Ainda conforme o sindicalista, apesar das muitas denúncias, o número de pessoas envolvidas com as fraudes e irregulares ainda é uma minoria. (RV)




Minientrevista

Empresário
vítima de corrupção
Ele precisou fechar sua autoescola
Você precisou fechar sua autoescola há seis meses, em Contagem, porque não suportou a concorrência de estabelecimentos que se sujeitaram à máfia das carteiras. É difícil continuar no ramo sendo honesto? É impossível. Ou você entra na corrupção ou quebra.
Como as autoescolas e instrutores que vendem carteiras se mantêm melhor no mercado? É que eles não dependem de dar aulas. Eles se sustentam com a venda de carteiras. Com isso, a concorrência fica impossível. Eles colocam preços muito baixos para atrair os alunos.
Você acredita que essas denúncias vão surtir efeito? Claro que é bom tocar na ferida. Mas isso que vocês publicaram é só a ponta do iceberg. O esquema é muito maior, a coisa é muito mais podre. É muito, mas é muito dinheiro que circula.
Você pretende voltar para o ramo? Não, de jeito nenhum. É um estresse muito grande. Eu até esperei um pouco, mas não deu. Resolvi sair mesmo.
27 jan 2010 - SiproVoltar