NOTÍCIAS » SEU ALUNO TEM MEDO DE DIRIGIR?

Entrar no carro, dar a partida, engatar a marcha, soltar o freio-de-mão. Para muitos um processo natural e rotineiro, mas para outros um verdadeiro pesadelo. Joelhos fraquejados, transpiração excessiva e a sensação de que o coração vai sair pela boca. É assim que se sentem as pessoas que sofrem da fobia de dirigir, um trauma que atinge um número considerável de pessoas no Brasil. Mais do que medo e ansiedade, a fobia de dirigir torna a vida de muitas pessoas cheia de dependência e privações. Para tentar esclarecer um pouco das dúvidas sobre este assunto que atinge muitos alunos de CFCs, o Informativo PRÓ-TRÂNSITO, conversou com Cecília Bellina*, Psicóloga, especialista em Psicologia do Trânsito e que já atendeu mais de 7 mil pessoas afetadas por traumas, medos e insegurança no trânsito.
PRÓ-TRÂNSITO: Existe um perfil de pessoas mais propensas a desenvolver o problema?
BELLINA: As pessoas que são muito ansiosas, por exemplo, estão mais propensas a desenvolver um tipo de fobia ou até transtorno de pânico. Normalmente a maioria das situações vividas por essas pessoas, é repleta dessa ansiedade. Uma das características do ansiosos é sempre imaginar uma situação futura como uma catástrofe, dando exemplos do tipo: “E se eu precisar ir ao supermercado e não encontrar lugar para estacionar?” Além disso, é necessário que situações mais estressantes aconteçam como um trauma, um acidente, ou até começar a ter crises de pânico dentro do automóvel, para que a fobia se instale e seja diagnosticada.
PRÓ-TRÂNSITO: A pessoa pode sofrer de fobia de dirigir e não se dar conta disso?
BELLINA:
Sim. Pode não perceber alguns comportamentos que são peculiares a fobia de dirigir, camuflando os sintomas. Percebemos em nossa clínica vários desses comportamentos: os clientes compram um carro ou são presenteadas com ele, e ao contrário do que normalmente ocorre (a felicidade o extremo) eles começam a inventar desculpas para não tirar o carro da garagem, usam a chuva a pressa ou a falta de estacionamento como pretexto para não saírem com o carro. Chegam até a emprestar o carro para os outros com o objetivo também de serem transportadas por eles.
PRÓ-TRÂNSITO: Existe alguma causa específica para justificar o número alto de mulheres que sofrem deste mal [90% das mulheres sofrem de fobia de dirigir]?
BELLINA: Na minha opinião existem três aspectos que justificariam esse número alto de mulheres que não dirigem por medo: Tipo de criação (questão cultural) - o carro ainda é considerado objeto masculino. O homem o explora desde criança, sendo presenteado com brinquedo que estimulam o ato de dirigir, como carrinhos e bicicletas, proporcionando adrenalina e mais energia, ficando desta forma, muito mais íntimos da questão carro. As mulheres por sua vez quando crianças mantém contato com brinquedos mais afetuosos como as bonecas, ficando mais distantes da direção veicular; Ansiedade - podemos dizer que muitas mulheres são mais ansiosas do que os homens ficando dessa forma mais vulneráveis para sentir medo; e por fim Prioridade - as mulheres normalmente se programam de forma diferente, se empenham em fazer uma faculdade, depois em ajudar os pais, desejam a casa própria e por último pensam no carro. Para o homem o caminho é inverso: o primeiro bem que ele adquire quando possuidor de autonomia financeira é o carro.
PRÓ-TRÂNSITO: Como o medo de dirigir influência na qualidade de vida das pessoas?
BELLINA:
Infelizmente moramos em um país que não prioriza o transporte coletivo e como conseqüência ele se torna de péssima qualidade as vezes de custo alto e fazendo percursos que levam um tempo de que o passageiro não pode dispor. Sendo assim, só nos resta a compra de um veículo. Porém, as pessoas acabem se sentindo frustradas pois têm condições de adquirir esse bem mas por medo não fazem. Isto causa um prejuízo imenso em todos os segmentos de sua vida: amoroso, profissional, familiar etc.
PRÓ-TRÂNSITO: Quais são os passos do tratamento? Existe um tempo médio para isso?
BELLINA: Primeiramente nos dispomos a conhecer nosso futuro cliente através de uma entrevista realizada pela própria psicóloga. Após esse primeiro contato, a psicóloga faz com o cliente uma breve avaliação no carro, com o objetivo de o conhecer junto ao seu objeto de medo. Finalizada essa primeira etapa o treinamento se inicia e consta de terapia em grupo ou terapias individuais e ainda aulas no carro. O tempo médio de tratamento varia de pessoa para pessoa por se tratar de uma terapia, porém a estimativa é de seis meses.
PRÓ-TRÂNSITO: Qual a vantagem de levar o tratamento de um trauma como este para fora do consultório?
BELLINA: Todas. A maneira mais eficiente de tratar do medo é enfrenta-lo onde ele acontece. Quando o cliente está longe do objeto de medo, a fantasia cresce e ele acaba imaginando situações muito ruins, atingindo proporções muito grandes. Quando é colocado diante do objeto fóbico, percebe que a fantasia, na realidade, é bem diferente. Logo a medida que ele vai sendo colocado no trânsito, sempre com muito cuidado, o cliente percebe que é capaz de dirigir, criando mais força e coragem de prosseguir com o treinamento.
PRÓ-TRÂNSITO: E quais as principais dicas que podem ajudar as pessoas a controlarem o medo de dirigir?
BELLINA: O ideal é ir a luta e começar a olhar o carro de forma diferente. Iniciar tirando-o da garagem algumas vezes, depois outro dia dar uma volta no quarteirão, aos poucos e com muito cuidado ir aumentando esse percurso, repetindo-o várias vezes até o medo passar, porém essa decisão só deverá ser tomada e o comportamento só deverá ser colocado em prática se a pessoa tiver certeza que consegue conduzir o carro, certeza do domínio da técnica, pois muitas vezes o medo prejudica a aprendizagem fazendo com que as pessoas não saibam dirigir desenvolvendo ainda mais a fobia. Neste caso o conselho não é viável, não procede.

*Cecília Bellina é psicóloga, especialista em Psicologia Comportamental e Psicologia do Trânsito e autora do livro “Dirigir Sem Medo”. Para conhecer mais sobre seu trabalho acesse o site www.ceciliabellina.com.br

22 mar 2006 - Informativo PRÓ-TRÂNSITO - SIPROCFC-MGVoltar