NOTÍCIAS » DETRAN DEIXA 5 MIL SEM CNH EM MINAS GERAIS

Agonia da espera no Detran
Burocracia dos departamentos Estadual e Nacional de Trânsito atrasa entrega da carteira a milhares de mineiros que renovaram ou tiraram a primeira habilitação
Ingrid Furtado
Regina Célia Mizrahy espera desde quinta-feira e não esconde a decepção ao ficar novamente de mãos vazias
Pelo menos 5 mil mineiros estão na dependência da burocracia do Departamento Estadual de Trânsito (Detran-MG) e do Departamento Nacional de Trânsito (Denatran) para conseguir ter em mãos a carteira nacional de habilitação (CNH). O impasse começou em 27 de fevereiro e atinge todos os que entraram com processo para obter segunda via da carteira, assim como renovação e primeira habilitação, contingente que aumenta a cada dia. O embaraço está longe de ser resolvido, porque não há consenso entre os órgãos federal e estadual quanto à origem do problema. Enquanto isso, quem depende da carteira para trabalhar ou apenas para se locomover paga o preço da ineficiência do poder público, dirigindo ou não.

O transtorno começou quando o Denatran iniciou o repasse de informação para o novo sistema do Registro Nacional de Carteiras de Habilitação (Renach). Em nota, o departamento informou que, em 27 de fevereiro, o Serviço Federal de Processamento de Dados (Serpro) iniciou a transposição de dados da antiga Base de Identificação Nacional de Condutores (Binco) para a nova formatação, ampliada. Por esse motivo, os serviços referentes à carteira de habilitação ficaram indisponíveis em todo o país. Mas o Denatran sustenta que no dia 4 a situação se normalizou e o sistema ficou acessível a todos os departamentos estaduais. Informou ainda que, se há dificuldade na emissão, o problema está nos Detrans, possivelmente porque não se adequaram ao novo sistema.

O assessor da Divisão de Habilitação de Minas Gerais, Arnot José Gomes Filho, diz que há falhas não somente no Detran, mas também no Denatran. Segundo ele, são emitidas no estado, por dia, 5 mil carteiras em média, mas o sistema nacional ainda está travado e, por isso, menos da metade está sendo expedida. “O Denatran nos informou que todos os processos de habilitação que entrassem a partir do dia 4 seriam redefinidos pelo novo sistema. Mas eles incluíram todos os processos antigos, anteriores à data de corte, e isso não estava combinado. Dessa forma, estamos fazendo um mutirão para alterar os dados de 5 mil habilitações que ainda estão na fila para serem emitidas”, justifica.

Ele acrescenta que o Detran não consegue acessar o novo sistema por falta de dados. “As clínicas de exames credenciadas pelo departamento estadual não informaram, por exemplo, o registro de seus funcionários nos conselhos regionais de Medicina e de Psicologia. Precisamos esperar essas informações, para acessar a nova Binco. Os processos novos, iniciados a partir do dia 4, estão em andamento. Mas, em alguns, os dados ainda estão incompletos. Esses são problemas que mais se destacam, mas há outros. Mesmo assim, esperamos que até o fim da semana a situação se normalize”, acrescenta.

Para se ter uma ideia da lentidão, o Detran está emitindo pouco mais de 1 mil carteiras diariamente. Anteontem, foram 1.153 e, até as 15h30 de ontem, 337 emissões. É o que informa o delegado Adilson Águido, um dos responsáveis pelo serviço de habilitação do Detran. Apesar do transtorno, não há nenhum plano para atender os motoristas vítimas da morosidade oficial. “Mesmo com esse problema, a pessoa não pode dirigir sem carteira. Caso seja multada nesse intervalo, o Detran vai emitir uma declaração informando o ocorrido, mas o condutor vai ter de entrar com recurso”, avisa o delegado.

Com a nova Binco, o Denatran terá acesso a todo histórico do habilitado. No banco de dados serão incluídos desde a identificação da auto-escola na qual o motorista se preparou até nomes dos profissionais dos exames médicos. Essas informações vão ajudar na elaboração de estatísticas e levantamentos mais completos sobre os motoristas, além de facilitar a manutenção de medidas para melhorar a formação de quem dirige.

Fotos: Euler Júnior/EM/D.A Press
Manoel de Souza, vendedor, depende da motocicleta para trabalhar e lamenta o prejuízo
DOR DE CABEÇA
Mas o que deveria ajudar, está atrapalhando a vida de muita gente. É caso de Manoel de Souza, de 40 anos. Ele é motociclista e perdeu a carteira de habilitação. Quando foi informado do atraso, ficou indignado. “Sou vendedor e dependo da moto para trabalhar. É injusto o cidadão ter de pagar por um erro que é dos órgãos públicos. Não posso ficar sem trabalhar e, se for prejudicado, vou buscar meus direitos. Isso é um absurdo.”

A pedagoga Regina Célia Mizrahy, de 38, espera desde quinta-feira pela primeira carteira de habilitação. Na fila do Detran, ela reclama. “Eles disseram que o prazo de espera era de cinco dias. Mas virou uma confusão. Fazemos os exames, pagamos as taxas corretamente e, mesmo assim, somos prejudicados”, afirma. Para evitar problemas, Clementina Xavier da Cruz, de 54, não perdeu tempo para renovar a carteira. “Pelo jeito, vai demorar muito para a situação se normalizar. Antes de minha carteira vencer, estou iniciando o processo de renovação”, diz.

Eduardo Caldeira, dirigente da Associação de Condutores Auxiliares de Táxi de Belo Horizonte (Acat), afirma que já há preocupação entre taxistas que renovaram a habilitação. Eles reclamam que a demora na entrega do documento pode forçá-los a parar, se a nova carteira não chegar antes da data-limite de validade. O coordenador-administrativo do Sindicato dos Rodoviários, Jorge Alves Viana, diz que a entidade vem tentando resolver alguns casos no Detran. Segundo ele, um motorista de uma empresa de ônibus que faz várias linhas rodoviárias no estado está há 19 dias esperando pelo documento, desde que fez o exame médico para renovar a CNH. O sindicalista garante que há muitos outros impedidos de trabalhar à espera da nova carteira.

“O sindicato tem se empenhado na negociação com as empresas para antecipar férias ou folgas daqueles que não receberam o documento novo. Mas nem sempre há tolerância e já houve até ameaça de demissão por justa causa se em 30 dias o funcionário não conseguir regularizar a situação. E há aqueles que sofrem no bolso, pois não recebem pelos dias parados”, explicou Jorge Alves. (Com Landercy Hemerson)
11 mar 2009 - ESTADO DE MINASVoltar