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Sem medo da Lei Seca
Motoristas de BH recebem, sem resistência, notícia da aprovação da emenda, pela Câmara dos Deputados, que proíbe qualquer quantidade de álcool no organismo
Ingrid Furtado
Jackson Romanelli/EM/d.a press - 4/2/08
Um copo de cerveja é suficiente para quem for flagrado numa blitz ser punido com rigor

A emenda aprovada na Câmara dos Deputados, em Brasília, que prevê tolerância zero a quem dirigir alcoolizado, recebeu aprovação de motoristas em Belo Horizonte, mesmo daqueles que assumem conduzir veículos depois de ingerir bebida alcoólica. O texto altera o Código de Trânsito Brasileiro (CTB) e aumenta o rigor na fiscalização. Quem for flagrado com qualquer quantidade de álcool no organismo será multado em R$ 985 e terá a carteira de habilitação suspensa por um ano. A iniciativa faz parte da Medida Provisória 415, que determina a proibição do comércio de bebida alcoólica nas rodovias federais, e depende ainda da sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

A medida, considerada impactante pelo próprio autor, deputado Hugo Leal (PSC), foi baseada em propostas já adotadas no Japão e na Suécia. Um ponto que causou polêmica entre motoristas de BH é o que dá autonomia às autoridades em aplicar penalidades, mesmo sem o uso do bafômetro (ou etilômetro). Se aprovada, a pessoa que se negar a fazer o teste no aparelho será multada da mesma forma. “Quando ocorre uma negação, entende-se que o condutor está alcoolizado. Ele vai ser punido administrativamente com multa e suspensão da carteira”, afirma o analista legislativo da Câmara, José Carlos Lopes.

Ele explica que, atualmente, o CTB permite até 0,6 grama de álcool no sangue. Com a aprovação da emenda, qualquer nível menor do que esse será intolerável. “A grande alteração é de que a pessoa não precisa estar embriagada para ser punida. Basta ter bebido doses alcóolicas e será responsabilizada”, explica Lopes. Se ultrapassar a 0,6 grama, o motorista é processado criminalmente, além de sofrer medidas administrativas.

“A idéia do projeto é criar na cultura do brasileiro o hábito de não beber e dirigir. Com a emenda, não haverá arestas para a pessoa escapar da punição”, diz o analista. Pesquisa realizada em Belo Horizonte com pacientes atendidos em três hospitais da capital, vítimas de acidentes de trânsito, mostrou que 15% deles haviam consumido bebida alcoólica nas oito horas anteriores ao acidente , conforme dados da Subsecretaria Estadual Antidrogas.

Assim como motoristas, autoridades de Minas Gerais receberam bem a alteração. No entanto, ainda há dúvida sobre a aplicação da lei. Os 42 postos da Polícia Rodoviária Federal( PRF) nas rodovias mineiras estão equipados com 44 bafômetros. O inspetor da PRF Aristides Júnior afirma que a proposta vai facilitar a fiscalização.

“A grande vitória da Lei Seca é a punição dos motoristas. Não adianta multar apenas os comerciantes. São os condutores que bebem e se envolvem em acidentes. O consumo de uma latinha de cerveja pode não significar alteração para alguns, mas, para outros, diluir 0,6 grama de álcool no organismo depende da massa corporal e até do que a pessoa comeu”, afirma o inspetor. Ele garante que quem transgredir a lei será punido. “Temos os equipamentos e, com a sanção da emenda, será ainda mais fácil fazer cumprir a legislação. Não haverá mais aquela desculpa de ‘só tomei uma cervejinha’. Vamos pegar mesmo”, avisa.

ESTRUTURA Em BH, de acordo com a Polícia Militar, há apenas quatro bafômetros. São da 1º Companhia de Trânsito Independente. Para Andréa Mendes de Souza Abood, da Delegacia de Acidentes de Veículos (DeAV), o mais importante é a aplicação da lei. “A medida é muito boa, mas precisamos de meios para ser efetivada. É uma proposta rígida que a sociedade precisa. Recebemos, por mês, 1,6 mil ocorrências de trânsito. Mas para ter sucesso é necessário criar estrutura”, diz a delegada.

O escultor Ricardo Afonso, de 59 anos, reconhece que, quase diariamente, dirige depois de beber cerveja. “Infelizmente, a prática é comum em BH. Por isso é que a lei se torna importante. Para mim, uma garrafa não é nada, mas para outros é sinônimo de acidente. Graças a Deus, nos 40 anos que dirijo, nunca me envolvi em batidas, mas há exemplos de sobra de quem bebe, pega o carro e mata alguém”, diz.

A rotina de beber e dirigir não é diferente para o autônomo Pedro Marcos Rodrigues, de 49. “Apesar de muito radical, concordo com a medida. Acho injusto não poder tomar minha cervejinha, mesmo que pouca, e depois ir para casa de carro. Mas, se é para salvar vidas, vale a pena. Agora, vou pensar duas vezes antes de dirigir alcoolizado”, promete. O estudante Lucas Castor Borges de Pádua pensa o mesmo: “Quem não deve, não teme. É justo multar aqueles que não querem fazer o exame no bafômetro. A decisão é polêmica, mas é só mexendo no bolso que a pessoa acorda.”

Fotos: Jorge Gontijo/EM/D.A Press

29 mai 2008 - Estado de MinasVoltar