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Por um trânsito inseguro

Estado de Minas - MG - 17/12/2010

Em 21 de novembro, celebrou-se o Dia Mundial em Memória às Vítimas de Trânsito. A data (terceiro domingo de novembro) foi criada para garantir mobilização da população contra uma violência previsível e confortar os milhões de parentes e amigos das vítimas que sofrem consequências materiais, sociais, emocionais desses eventos trágicos. Essa foi a forma que a Organização das Nações Unidas (ONU) encontrou para chamar atenção para uma verdadeira epidemia que acomete o mundo. Às mortes no trânsito, que totalizam quase 1,3 milhão, agregam-se 50 milhões de feridos e incapacitados em decorrência da imprudência ao volante a cada ano. Assim como toda epidemia, tem amplo impacto e abrangência e causa consequências profundas de ordem econômica e social, ligadas a áreas relacionadas ao trânsito, saúde, trabalho e previdência, por exemplo.
Então, é preciso deixar de pensar o acidente de trânsito como um fato pontual, uma ocorrência de algo banal. Não caem aviões todo dia, não se travam guerras todo dia - mas as pessoas temem quando isso ocorre. Já o trânsito mata muito mais e os acidentes viários ocorrem todo dia. A grande questão é que mesmo as ações diretas, como fiscalização e punição, só têm efeito de forma indireta, para estimular as boas práticas e a mudança de comportamento. O motorista de comportamento transgressor sempre vai buscar meios de não obedecer às leis e a fiscalização ou burlá-las. Grande parte dessa responsabilidade é do governo, que só passou a se preocupar com essa epidemia de mortes quando o custo dessas vidas absorveu parte significativa de verbas da Saúde, Previdência, e até dos ministérios do Trabalho e da Fazenda.
Segundo o Ministério da Saúde, 37 mil brasileiros morreram no trânsito em 2008 - outros 100 mil foram internados desde setembro de 2009, conquistando o primeiro lugar no ranking de procedimentos mais custosos ao Sistema Único de Saúde (SUS): são 113,4 milhões por ano. Estima-se que 20% dessas vítimas carregam sequelas para o resto de suas vidas e 4% simplesmente não sobrevivem. O prejuízo não para aí: são milhares de aposentados por invalidez, custo de conservação das vias, postos de trabalho e uma série de condições especiais que precisam ser criadas para as vítimas. A parte mais importante desse quadro, a redução dos acidentes e, consequentemente, das mortes no trânsito, é prerrogativa incluída na Década de Ação pela Segurança no Trânsito - campanha global criada pela Organização Mundial da Saúde (OMS). A proposta é simples: a OMS sugere aos países que se comprometam formalmente e definam políticas públicas e ações efetivas em defesa da segurança no trânsito e da prevenção das mortes e dos traumas nas ruas e estradas de todo o mundo. No entanto, o Brasil parece não ter tomado conhecimento: a década vai começar (2011-2020) e pouco foi feito. O governo brasileiro está respondendo às sugestões (pressões?) da OMS e começa a reagir com promessas que, esperamos, possam se tornar realidade. O envolvimento da sociedade ainda é tímido.
O Brasil, por sua posição crítica no ranking de acidentes, tem muito a ganhar com ações nesta área. Esse ganho vai refletir não só economicamente, mas também politicamente, afinal, acompanhamos a chegada dos dois maiores eventos esportivos do mundo e o trânsito está umbilicalmente ligado à logística e bom funcionamento deles. Não devemos nos esquecer de que o perigo potencial do trânsito só tende a crescer, pois o volume de veículos nas vias será cada vez maior, o que torna imperioso o cuidado com o controle do fluxo e com a atenção às regras de trânsito. Os acidentes, cada vez mais, geram, além dos custos materiais diretos, custos sociais indiretos, que se tornam mais e mais importantes quanto mais complexa fica a sociedade. Em 21 de novembro, cerca de 60 entidades, entre ONGs, órgãos de trânsito e empresas atuantes no setor, se reuniram em Florianópolis para abrir os olhos das autoridades: parentes e vítimas estiveram presentes no evento para falar de suas experiências e traumas. Lá, circulou um abaixo-assinado pedindo que a década fosse posta em prática aqui. Mais uma vez: mesmo as ações diretas - a população pedindo que o governo tome uma atitude - têm efeito indireto. Esse material será encaminhado ao Congresso, para que os parlamentares analisem e verifiquem que propostas podem ser apresentadas.
*José Mário de Andrade é Especializado em tecnologia para a segurança e gestão integrada de tráfego

20 dez 2010 - Estado de Minas - MG - 17/12/2010Voltar